terça-feira, 10 de abril de 2012

Orientações para regulamentação de programas de bolsas acadêmicas

ORIENTAÇÕES PARA REGULAMENTAÇÃO DE PROGRAMAS DE BOLSAS ACADÊMICAS
GUSTAVO MONTEIRO FAGUNDES (*)
A recente edição da Portaria Normativa MEC nº 2/2012, regulamentada pela Portaria SESu/MEC nº 87, de 3 de abril de 2012, tem como escopo precípuo estabelecer a vedação a qualquer tipo de conduta discriminatória em relação aos discentes beneficiários do Prouni e do Fies no que diz respeito às políticas institucionais para concessão de descontos e bolsas acadêmicas de qualquer natureza.
Com efeito, o artigo 2º da Portaria Normativa nº 2/2007 é absolutamente claro ao vedar qualquer tipo de conduta discriminatória entre alunos pagantes e alunos beneficiários do Prouni ou do Fies, assim dispondo:
“Art. 2º. Todos os alunos estarão igualmente regidos pelas mesmas normas e regulamentos internos das IES, vedado o tratamento discriminatório entre os alunos pagantes e beneficiários do Prouni ou do Fies, inclusive quanto à concessão de bolsas de mérito acadêmico, estágios e desconto pontualidade.”
A princípio, seria absolutamente desnecessário tal dispositivo, porquanto, na condição de alunos regulares das instituições de ensino, conforme, registre-se, deixam evidentes as normas que regulamentam o Prouni e o Fies, a adoção de quaisquer práticas discriminatórias em relação aos mesmos já se encontra vedada ab initio.
Todavia, a conduta das próprias instituições de ensino, estabelecendo distinções no tratamento dispensado a esses alunos, terminou por demandar uma atitude mais incisiva do Ministério da Educação, através da edição das mencionadas normas regulamentadoras, como ferramenta para tornar ainda mais evidente a vedação legal ao tratamento discriminatório em relação aos discentes beneficiários do Prouni ou do Fies.
Destarte, reiterando a vedação já existente, e buscando regulamentar o conteúdo da Portaria Normativa MEC nº 2/2012, a Portaria SESu/MEC nº 87, de 3 de abril de 2012, assim estabelece em seu artigo 1º:
“Art. 1º. Os descontos regulares e de caráter coletivo bem como as modalidades de bolsa com características de desconto, concedidos pela instituição de ensino superior – IES devem incidir sobre a totalidade dos encargos educacionais referentes à bolsa parcial do Prouni e ao financiamento estudantil contratado por meio do Fies, sendo vedada qualquer forma de discriminação, mesmo que por meio de cláusulas nos contratos de prestação de serviços educacionais, entre estudantes beneficiários do Prouni ou do Fies e os demais estudantes da instituição.”
Logo no artigo seguinte, para evitar entendimentos conflitantes, a Portaria SESu/MEC nº 87/2012 explicita os conceitos dos institutos mencionados no artigo 1º:
“Art. 2º. Para os efeitos da Portaria Normativa nº 2, de 2012, são considerados:
I – descontos regulares e de caráter coletivo: os valores deduzidos dos encargos educacionais normalmente praticados pela instituição de ensino superior para a totalidade dos estudantes, bem como para determinados grupos de estudantes que atendam a circunstâncias específicas para a sua concessão, segundo as regras internas da IES;
II – modalidades de bolsa com características de desconto: aquelas instituídas por liberalidade da IES com incidência sobre os encargos educacionais, especialmente aquelas conferidas ao estudante:
a) por mérito acadêmico ou destaque em atividades da instituição, inclusive esportivas;
b) com o objetivo de incentivar a participação em projetos de iniciação científica ou extensão;
c) com o objetivo de propiciar a complementação do ensino e aprendizado de competências próprias na linha de formação curricular, realizado no âmbito da instituição de ensino ou de empresas conveniadas à instituição, segundo os critérios definidos pelo regimento interno da IES e consoante as regras instituídas pela Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008;
d) em razão de vínculo familiar com outros estudantes da IES, de acordo com os critérios definidos pelo regimento interno da instituição.”
Desse modo, a intenção explícita do MEC ao promover a edição das referidas normas é determinar que os alunos beneficiários do Prouni ou do Fies tenham assegurado o acesso aos programas de concessão de descontos e bolsas acadêmicas em condições de igualdade com os alunos pagantes, porquanto, repita-se, todos são alunos regulares das instituições, inexistindo justificativa legal para adoção de práticas discriminatórias.
Necessário, portanto, que as regulamentações dos programas de bolsas acadêmicas das instituições de ensino sejam absolutamente cristalinos ao prever a possibilidade todos os alunos regulares concorrerem, em condições isonômicas, e com avaliação exclusivamente nos critérios técnicos aplicáveis a cada programa individualmente considerado, às bolsas disponibilizadas.
Entre os programas de bolsas acadêmicas usualmente adotados podemos apontar os seguintes, sem prejuízo de outros programas criados pelas instituições de ensino superior:
I - Bolsas de mérito acadêmico ou destaque em atividades da instituição, inclusive esportivas: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos que se destaquem em diferentes segmentos da vida acadêmica, seja por aproveitamento nos estudos, participação de destaque em atividades de responsabilidade social, esportivas ou quaisquer outras modalidades de atividades que a instituição pretenda destacar e recompensar;
II - Bolsas de estímulo à participação em atividades de iniciação científica ou de extensão: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos que tenham participação ativa em projetos de iniciação científica, pesquisa ou atividades de extensão;
III - Bolsas de estágio: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos que desenvolvam atividades de estágio, nos termos e condições da Lei nº 11.788/2008;
IV – Bolsas de monitoria: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos que desenvolvam atividades de monitoria, nos termos de regulamentação a cargo de cada IES;
V - Bolsas familiares: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos que possuam vínculo familiar com outros estudantes ou membros dos corpos docente e técnico-administrativo das instituições de ensino, em conformidade com normas coletivas de trabalho e com o regramento interno de cada IES;
VI - Bolsas de convênios: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos beneficiários de convênios de cooperação e assemelhados celebrados entre as instituições de ensino e entidades de classe, sindicatos, associações e outros; e
VII - Bolsas de estímulo ao preenchimento de vagas ociosas: programas destinados à concessão de bolsas acadêmicas para alunos que optem pela matrícula em cursos e turnos de oferta com vagas ociosas, conforme planejamento estratégico e regulamentação de cada instituição.
Evidentemente, essa relação não é restritiva, podendo as instituições criar programas de bolsas acadêmicas de forma a atender às suas peculiaridades e necessidades específicas, bem como para promover sua inserção comunitária e social.
No mesmo sentido, incumbe a cada instituição de ensino promover a devida e adequada regulamentação de seus programas de bolsas acadêmicas, de forma a atender às suas situações específicas e, principalmente, para tornar transparente todo o processo de inscrição, seleção, classificação e concessão das bolsas acadêmicas.
Este regramento interno, contudo, deve atentar para alguns pontos fundamentais, para que atendam de forma plena aos ditames legais pertinentes, bem como para evitar controvertimentos e interpretações casuísticas.
O primeiro aspecto, e talvez o mais importante, é a necessidade de restar expressamente registrado que o acesso aos programas é permitido a todos os alunos regulares da instituição que atendam aos critérios previstos, sem distinção entre pagantes, beneficiários do Prouni ou do Fies.
Vale dizer, os critérios de seleção e classificação dos beneficiários devem ser exclusivamente pertinentes ao objeto do programa de bolsas, de modo que, exemplificativamente, um programa de bolsas por mérito acadêmico somente pode estipular critérios de acesso ligados à aferição do mérito acadêmico dos alunos interessados.
Esta premissa, obviamente, se aplica a todo e qualquer programa de concessão de bolsas acadêmicas, cujos critérios de acesso e seleção, repita-se, devem ser adstritos à aferição das condições de mérito pertinentes a cada programa individualmente considerado.
Não podem, portanto, ser estabelecidos critérios formais de seleção que estabeleçam distinção ou privilégio em decorrência da situação contratual do candidato, pouco importante se é aluno pagante ou beneficiário do Prouni ou do Fies.
Outro aspecto que deve ser contemplado na regulamentação é a previsão do alcance da bolsa em termos do desconto a incidir sobre a parcela dos encargos educacionais contratados ente o aluno e a instituição de ensino.
O regulamento deve prever claramente que, na hipótese da bolsa acadêmica concedida, somada à bolsa parcial do Prouni ou ao financiamento parcial do Fies, ultrapassar o valor dos encargos contratados, a bolsa acadêmica será limitada ao percentual remanescente eventualmente suportado pelo aluno, sem que a concessão de bolsa inferior ao montante originalmente previsto configure qualquer tipo de discriminação, haja vista o atingimento da gratuidade total com a soma dos benefícios obtidos pelo aluno na hipótese ora prevista.
Desse modo, é fundamental que as instituições de ensino superior promovam a adequação das normas que regulamentam seus programas de concessão de bolsas acadêmicas, observando os aspectos acima elencados e, sobretudo, assegurando o definitivo afastamento de quaisquer obstáculos aos alunos beneficiários do Prouni ou do Fies no que diz respeito ao acesso a tais programas.
Além de todas as orientações já traçadas, nunca é demais lembrar que os regulamentos internos devem, sempre, primar pela clareza e pela objetividade.
(*) Especialista em Direito Educacional e Consultor Jurídico do ILAPE – Instituto Latino-Americano de Planejamento Educacional e da ABMES – Associação Brasileira de Mantenedores de Ensino Superior. Professor do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito e Gestão Educacional e coautor do livro LDB Anotada e Comentada e Reflexões sobre a Educação Superior – 2ª edição revista e ampliada.

Disponível também em: www.ilape.edu.br

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