terça-feira, 23 de agosto de 2011

Falácias e Fanfarronices do MEC

Os dirigentes do Ministério da Educação parecem acreditar piamente naquela máxima segundo a qual uma mentira repetida à exaustão teria o condão de transformar-se em verdade.
Tem sido assim com o reiterado discurso de que as instituições privadas de ensino oferecem educação de baixa qualidade, ao passo que somente as instituições públicas teriam condição de oferecer boa educação.
Aliás, o CPC e o IGC, com suas fórmulas cabalísticas e intrincadas parecem ter sido criados justamente para alicerçar este conceito, muitas vezes equivocados.
Com efeito, basta conferir a relação do IGC divulgada pelo próprio MEC para verificar que o topo da lista não é ocupado por instituição pública...
O novo alvo da tática de discurso falacioso é a composição do corpo docente das instituições de ensino, pois, segundo o próprio Ministro, é necessário impedir a aprovação do projeto de lei que tramita no Congresso Nacional objetivando a permissão para contratação de graduados para o exercício do magistério superior.
O argumento exaustivamente repetido, na tentativa de emprestar-lhe veracidade, é a suposta ampliação crescente da quantidade de graduados no corpo docente das instituições privadas de ensino superior, como fórmula para baratear o custo da oferta do ensino.
A fanfarronice do Ministro, contudo, esbarra de forma insofismável nos dados do Censo da Educação Superior, recentemente divulgados pelo MEC/INEP, relativamente ao ano de 2009.
Segundo os dados divulgados no Censo Educacional, no documento denominado “Resumo Técnico – Censo da Educação Superior 2009”, disponível no site do INEP(http://download.inep.gov.br/download/superior/censo/2009/resumo_tecnico2009.pdf), a realidade é diametralmente oposta ao discurso veiculado pelos dirigentes do MEC.
Inicialmente, cumpre destacar que, segundo os dados do Censo Educacional, as 2.314 instituições de ensino superior portadoras do ato autorizativo de credenciamento institucional em 2009 estavam assim distribuídas em relação à sua classificação:
- 2.069 IES privadas (89,41%); e
- 245 IES públicas (10,59%).
Caso a premissa sustentada pelo MEC acerca da maciça contratação de graduados para exercer a docência nas instituições de ensino superior privados fosse verdadeira, os dados do Censo Educacional deveriam apontar para uma grande massa desta categoria de docentes nas IES privadas.
Todavia, não é isso que os dados divulgados pelo INEP demonstram.
Na verdade, eles mostram exatamente o oposto.
Vejamos os números divulgados pelo Censo Educacional para os anos de 2008 e 2009, de modo a demonstrar que a verdade é exatamente oposta ao discurso dos dirigentes do MEC.
Em 2008, o Censo Educacional registrava a existência de 33.702 docentes graduados, assim distribuídos:
- 19.981 docentes graduados nas IES privadas (59,28%); e
- 13.721 docentes graduados nas IES públicas (40,72%).
Ora, se a premissa falaciosamente divulgada pelo MEC fosse verdadeira, os dados do ano de 2009 traria um crescimento da quantidade de docentes graduados nas instituições privadas, com a sua natural redução nas instituições públicas.
Todavia, o que ocorreu foi exatamente o inverso, com o significativo aumento da quantidade de docentes graduados nas instituições públicas, tanto em termos absolutos quanto percentuais, com a conseqüente redução destes quantitativos nas instituições privadas.
Com efeito, vejamos os dados lançados no Censo Educacional relativamente ao ano de 2009, no que pertine aos docentes graduados:
- 13.950 docentes graduados nas IES privadas (49,96%); e
- 13.971 docentes graduados nas IES públicas (50,04%).
Podemos verificar, com esses dados, que as instituições privadas reduziram, em termos absolutos, seu contingente de professores graduados de 19.981 docentes em 2008 para 13.950 docentes em 2009.
Por outro lado, as instituições públicas, que mantinham 13.721 docentes graduados em 2008, trataram de aumentar esta quantidade para 13.971 professores em 2009.
Assim, as 2.069 instituições de ensino superior privadas credenciadas possuem 13.950 docentes graduados, o que aponta para a média de 6,74 docentes graduados por IES privada.
As 245 instituições públicas credenciadas, por seu turno, possuem 13.971 docentes graduados, apresentando, portanto, uma elevada média de 57,02 docentes graduados por IES pública.
Em termos percentuais, esta diferença fica ainda mais gritante, uma vez que as instituições de ensino superior privadas, que são 89,41% das IES credenciadas, possuem 49,96% do total de docentes graduados, ao passo que as instituições públicas, que são 10,59% do total das IES credenciadas, possuem em seus quadros 50,04% dos docentes graduados.
Evidente, portanto, que as instituições públicas, ao contrário do que alega o Ministério da Educação, é que vem ampliando a presença dos professores graduados em seus corpos docentes, talvez buscando enxugar o custo e aproveitar os remanescentes orçamentários para ampliar os luxos ostentados por seus dirigentes.
Os números não mentem, e tratam de demonstrar as falácias e fanfarronices que emolduram o ensaiado e desatualizado discurso dos dirigentes do Ministério da Educação.
Os dados do Censo Educacional da Educação Superior de 2009 deixam a descoberto o rei despido, demonstrando que a verdade nem sempre é prioridade no discurso dos gestores públicos brasileiros, sobretudo quando os números oficiais demonstram a inverdade dos argumentos preconceituosos que buscam denegrir a imagem da educação superior privada.

O MEC e o FEBEAPÁ Normativo

Acredito que todos aqueles que, como eu, já passaram dos vinte anos, lembram do grande Stanislaw Ponte Preta, vulgo Sérgio Porto, e seu inesquecível FEBEAPÁ – Festival de Besteira que Assola o País, focado, essencialmente, nos absurdos oriundos da máquina burocrática.
Aliás, impossível não lembrar do impagável FEBEAPÁ todas as vezes que o MEC edita algum tipo de ato normativo, como aconteceu, recentemente, com a descabida republicação da Portaria Normativa n° 40/2007, ao completo arrepio das normas em vigor.
Foi recentemente publicado o Decreto nº 7480/2011, que aprova a nova estrutura organizacional do MEC, e ele, novamente, traz alguns absurdos que, aparentemente, não foram notados pela instância revisora.
A primeira coisa que podemos verificar é a superposição de competências, instâncias e atribuições, numa indisfarçada tentativa de acomodar os companheiros de partido, gerando, assim, uma fonte mais ampla de recolhimento de dízimo para os cofres partidários.
Em uma leitura, ainda que desatenta, salta aos olhos a questão da renovação dos cursos de bacharelado e licenciatura, pois não há indicação, no texto legal, do órgão responsável por tais atos autorizativos, ao contrário do que ocorre com os cursos superiores de tecnologia.
Com efeito, o artigo 27 do referido Decreto, ao estipular as competências da ora criada Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior assim dispõe em seus incisos III e IV:
“Art. 27. À Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior compete:
III - promover a supervisão relativa ao credenciamento e recredenciamento das instituições que integram o Sistema Federal de Educação Superior, bem como a autorização e o reconhecimento de seus cursos superiores de graduação;
IV - credenciar e recredenciar as instituições de educação tecnológica privadas, bem como autorizar, reconhecer e renovar o reconhecimento de seus cursos superiores de tecnologia;”.
Adiante, ao regulamentar as atribuições da Diretoria de Regulação e Supervisão da Educação Profissional e Tecnológica, o inciso II do artigo 28 praticamente reitera o contido no inciso IV do artigo 27, nos seguintes termos:
“Art. 28. À Diretoria de Regulação e Supervisão da Educação Profissional e Tecnológica compete:
II - orientar e coordenar o processo de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos superiores de tecnologia ofertados pelo Sistema Federal de Ensino, em consonância com as orientações e diretrizes da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior;”.
Assim, existe expressa previsão legal para a prática dos atos de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos superiores de tecnologia, que serão editados pela Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior, mediante atuação prévia da Diretoria de Regulação e Supervisão da Educação Profissional e Tecnológica.
No que diz respeito aos cursos de bacharelado e licenciatura, o inciso II do artigo 29 assim estipula a competência da Diretoria de Regulação e Supervisão da Educação Superior:
“Art. 29. À Diretoria de Regulação e Supervisão da Educação Superior compete:
I - promover a supervisão relativa ao credenciamento e recredenciamento das instituições que integram o Sistema Federal de Educação Superior, bem como a autorização e o reconhecimento de seus cursos superiores de graduação;”.
Ao contrário do verificado com os cursos superiores de tecnologia, inexiste previsão acerca da renovação de reconhecimento dos cursos superiores de bacharelado e licenciatura, uma vez, que tal competência não restou atribuída a nenhum dos órgãos que integram a estrutura do MEC.
Resta a questão: estamos diante de mais uma norma mal elaborada pelo MEC ou a intenção do ministério é acabar com a figura da renovação de reconhecimento dos cursos de bacharelado e licenciatura, mantendo-a apenas para os cursos superiores de tecnologia?
Outra passagem que demonstra o descuido dos redatores do Decreto em comento é o artigo 37, que trata da competência do Conselho Nacional de Educação, nos seguintes termos:
“Art. 37. Ao CNE cabe exercer as competências de que trata a Lei no 4.024, de 20 de dezembro de 1961.”
A menção pura e simples à antiga LDB (Lei n° 4.024/1961) se mostra descabida, porquanto, embora os artigos 6º a 9º, que tratam das atribuições do Conselho Nacional de Educação, não tenham sido revogadas pela nova LDB, é impositivo registrar que seu conteúdo foi substancialmente modificado pela Lei n° 9.131/1995.
Desse modo, o mínimo que deveria estar lançado no texto legal era que as competências do CNE estão traçadas nos artigos 6º a 9º da Lei n° 4.024/1961, com a redação que lhe foi dada pela Lei n° 9.131/1995, porquanto é impositivo registrar que a redação das normas legais deve ser clara e precisa o suficiente para permitir ao cidadão a compreensão adequada de seu texto.
Mas seria muito esperar do Ministério da Educação a redação adequada e escorreita dos atos normativos que produz, afinal, estamos falando de um ente público que adota a prática de plagiar artigos de autores qualificados e que exige que “nós use” os “livro” didáticos que ensinam a escrever errado.
E ainda perguntam o porquê de nossa educação estar reiteradamente classificada entre as de menor qualidade entre os países ditos emergentes, com índices de qualidade sofríveis...

A SITUAÇÃO DO PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS - PROUNI


A SITUAÇÃO DO PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS - PROUNI
GUSTAVO MONTEIRO FAGUNDES (*)
A mídia tem apresentado, rotineiramente, denúncias de fraude na concessão das bolsas do Programa Universidade para Todos – PROUNI – segundo as quais diversos estudantes que não fazem jus aos benefícios estipulados no programa estão sendo contemplados pelas instituições de ensino.
A quantidade de fraudes apontadas, assim como o grande número de bolsas não ofertadas pela suposta falta de candidatos tem levado o MEC a estudar alterações no PROUNI, algumas delas coerentes, outras nem tanto.
Para que possamos analisar com mais cuidado as fraudes identificadas no PROUNI, precisamos, inicialmente, lembrar que a pré seleção dos interessados é realizada pelo próprio MEC, que encaminha a relação dos pré selecionados para as IES, as quais, por seu turno, possuem, junto com o MEC, a atribuição de verificar o preenchimento dos requisitos legais para concessão das bolsas destinadas aos beneficiários do referido programa.
Impositivo registrar que as IES não possuem poder de polícia para fiscalizar, de forma incisiva, a documentação apresentada pelos estudantes, até porque o próprio Código Civil, em seu artigo 422, estabelece o princípio da boa-fé como essencial à celebração de qualquer tipo de contrato, verbis:
“Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Desse modo, ao receber a documentação do estudante, devidamente pré selecionado pelo MEC, as IES, cumprindo a regra traçada no Código Civil, presumem a boa-fé do contratante e, com base neste princípio, recebem e analisam a documentação comprobatória de seu enquadramento no espartilho traçado pela Lei n° 11.096/2005, que estipula as condições necessárias para acesso às bolsas de estudo concedidas no âmbito do PROUNI.
Vale registrar, ainda, que as normas processuais em vigor estabelecem a desnecessidade de autenticação das fotocópias de documentos, salvo quando lhe for contestada a autenticidade, conforme, inclusive, já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça:
“A simples impugnação de uma parte não obriga necessariamente a autenticação de documento oferecido pela outra. Faz-se mister que esta impugnação tenha relevância apta a influir no julgamento da causa, como, por exemplo, não espelhar o documento o verdadeiro teor do original.” (STJ – Corte Especial, ED no REsp 278.766-EDcl, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, j. 25.10.2004, acolheram os embargos, v.u., DJU 16.11.2004, p.173).
Ora, no caso dos estudantes beneficiados pelo PROUNI, a partir da constatação de que já foram pré selecionados pelo MEC, a obrigação das IES se limita à conferência do atendimento aos requisitos estipulados na Lei n° 11.096/2005, através dos documentos entregues pelos próprios estudantes.
Tanto é que, recentemente, foi notícia na mídia a situação de um estudante beneficiário do PROUNI no estado de Pernambuco que, diante da exigência da apresentação da documentação comprobatória da situação financeira de todos os membros de seu núcleo familiar básico, recorreu ao Poder Judiciário e obteve êxito, impondo à IES o deferimento de sua matrícula no âmbito do referido programa sem a necessidade de apresentar a integralidade dos documentos exigidos pela IES.
A partir deste exemplo, podemos imaginar sem maiores dificuldades qual seria a postura do Poder Judiciário caso as IES exigissem dos candidatos pré selecionados pelo MEC para concessão de benefícios do PROUNI a apresentação, por exemplo, da última declaração de imposto de renda dos membros de seu grupo familiar básico...
Talvez seja necessário, neste caso específico, o avanço das normas regulamentadoras, com a estipulação, a partir de norma conjunta a ser baixada pelo MEC e pelo Ministério da Fazenda, da documentação apta à comprovação da inclusão dos estudantes dentro dos requisitos legais para acesso ao PROUNI.
O fato é que, atualmente, o MEC está empurrando para as IES a sua atribuição de selecionar os estudantes aptos ao recebimento das bolsas concedidas no âmbito do PROUNI, provavelmente para poder lavar as mãos quando surgem casos de fraudes que permitem a participação, no programa, de estudantes que não preenchem os requisitos legais,esquecendo que, nos termos da Lei n° 11.096/2005, a obrigação de realizar a pré seleção é do MEC, incumbindo às IES verificar o cumprimento das condições já analisadas pelo agente público responsável.
De toda forma, é certo que o PROUNI demanda algumas correções de rumo para que possa atingir, efetivamente, o objetivo para o qual foi idealizado.
Uma questão que há muito vem sendo ventilada é a revisão, para mais, dos limites de renda familiar mensal exigidos para concessão das bolsas integrais e parciais no âmbito do PROUNI.
Ao invés de buscar uma solução que efetivamente permita a expansão dos benefícios do PROUNI para uma parcela maior da população que almeja o acesso ao ensino superior, o MEC prefere seguir pela trilha já tradicional do preconceito contra o ensino privado.
A proposta atual do MEC prevê a concessão de isenção parcial dos tributos previstos no artigo 8º da Lei n° 11.096/2005, em regime proporcional ao preenchimento das bolsas ofertadas no âmbito do PROUNI.
Pode até ser uma solução para os problemas enfrentados pelo programa, desde, é claro, que não seja imposta, em caráter retroativo, para afetar as IES que já tenham aderido ao Programa Universidade Para Todos – PROUNI, pois estas se encontram albergadas pela proteção constitucional ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito.
Obviamente, as IES que já fizeram sua adesão originária ao PROUNI, independentemente das renovações semestrais, fazem jus à manutenção das condições originalmente estipuladas pela Lei n° 11.096/2005, segundo a qual o direito à isenção plena dos tributos previstos em seu artigo 8º depende apenas da efetiva adesão ao programa.
Desse modo, ao mesmo tempo em que precisamos repensar a situação do PROUNI e encontrar soluções para as fraudes que impedem o acesso dos estudantes que efetivamente fazem jus aos benefícios do programa, faz-se necessário firmar posição em defesa do direito adquirido das IES que já tenham formalizado sua adesão ao mesmo, cuja regra legal não pode ser modificada neste momento.
Fundamental manter atenção ao tema, uma vez que a gestão do Ministério da Educação, mantida pela nova governante, já demonstra claramente sua intenção de manter a triste história de ilegalidades e arbitrarieades que marcaram os últimos oito anos.
(*) Especialista em Direito Educacional e Consultor Jurídico do ILAPE – Instituto Latino-Americano de Planejamento Educacional e da ABMES – Associação Brasileira de Mantenedores de Ensino Superior. Professor do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito e Gestão Educacional e coautor do livro LDB Anotada e Comentada e Reflexões sobre a Educação Superior – 2ª edição revista e ampliada.