terça-feira, 23 de agosto de 2011

A SITUAÇÃO DO PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS - PROUNI


A SITUAÇÃO DO PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS - PROUNI
GUSTAVO MONTEIRO FAGUNDES (*)
A mídia tem apresentado, rotineiramente, denúncias de fraude na concessão das bolsas do Programa Universidade para Todos – PROUNI – segundo as quais diversos estudantes que não fazem jus aos benefícios estipulados no programa estão sendo contemplados pelas instituições de ensino.
A quantidade de fraudes apontadas, assim como o grande número de bolsas não ofertadas pela suposta falta de candidatos tem levado o MEC a estudar alterações no PROUNI, algumas delas coerentes, outras nem tanto.
Para que possamos analisar com mais cuidado as fraudes identificadas no PROUNI, precisamos, inicialmente, lembrar que a pré seleção dos interessados é realizada pelo próprio MEC, que encaminha a relação dos pré selecionados para as IES, as quais, por seu turno, possuem, junto com o MEC, a atribuição de verificar o preenchimento dos requisitos legais para concessão das bolsas destinadas aos beneficiários do referido programa.
Impositivo registrar que as IES não possuem poder de polícia para fiscalizar, de forma incisiva, a documentação apresentada pelos estudantes, até porque o próprio Código Civil, em seu artigo 422, estabelece o princípio da boa-fé como essencial à celebração de qualquer tipo de contrato, verbis:
“Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Desse modo, ao receber a documentação do estudante, devidamente pré selecionado pelo MEC, as IES, cumprindo a regra traçada no Código Civil, presumem a boa-fé do contratante e, com base neste princípio, recebem e analisam a documentação comprobatória de seu enquadramento no espartilho traçado pela Lei n° 11.096/2005, que estipula as condições necessárias para acesso às bolsas de estudo concedidas no âmbito do PROUNI.
Vale registrar, ainda, que as normas processuais em vigor estabelecem a desnecessidade de autenticação das fotocópias de documentos, salvo quando lhe for contestada a autenticidade, conforme, inclusive, já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça:
“A simples impugnação de uma parte não obriga necessariamente a autenticação de documento oferecido pela outra. Faz-se mister que esta impugnação tenha relevância apta a influir no julgamento da causa, como, por exemplo, não espelhar o documento o verdadeiro teor do original.” (STJ – Corte Especial, ED no REsp 278.766-EDcl, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, j. 25.10.2004, acolheram os embargos, v.u., DJU 16.11.2004, p.173).
Ora, no caso dos estudantes beneficiados pelo PROUNI, a partir da constatação de que já foram pré selecionados pelo MEC, a obrigação das IES se limita à conferência do atendimento aos requisitos estipulados na Lei n° 11.096/2005, através dos documentos entregues pelos próprios estudantes.
Tanto é que, recentemente, foi notícia na mídia a situação de um estudante beneficiário do PROUNI no estado de Pernambuco que, diante da exigência da apresentação da documentação comprobatória da situação financeira de todos os membros de seu núcleo familiar básico, recorreu ao Poder Judiciário e obteve êxito, impondo à IES o deferimento de sua matrícula no âmbito do referido programa sem a necessidade de apresentar a integralidade dos documentos exigidos pela IES.
A partir deste exemplo, podemos imaginar sem maiores dificuldades qual seria a postura do Poder Judiciário caso as IES exigissem dos candidatos pré selecionados pelo MEC para concessão de benefícios do PROUNI a apresentação, por exemplo, da última declaração de imposto de renda dos membros de seu grupo familiar básico...
Talvez seja necessário, neste caso específico, o avanço das normas regulamentadoras, com a estipulação, a partir de norma conjunta a ser baixada pelo MEC e pelo Ministério da Fazenda, da documentação apta à comprovação da inclusão dos estudantes dentro dos requisitos legais para acesso ao PROUNI.
O fato é que, atualmente, o MEC está empurrando para as IES a sua atribuição de selecionar os estudantes aptos ao recebimento das bolsas concedidas no âmbito do PROUNI, provavelmente para poder lavar as mãos quando surgem casos de fraudes que permitem a participação, no programa, de estudantes que não preenchem os requisitos legais,esquecendo que, nos termos da Lei n° 11.096/2005, a obrigação de realizar a pré seleção é do MEC, incumbindo às IES verificar o cumprimento das condições já analisadas pelo agente público responsável.
De toda forma, é certo que o PROUNI demanda algumas correções de rumo para que possa atingir, efetivamente, o objetivo para o qual foi idealizado.
Uma questão que há muito vem sendo ventilada é a revisão, para mais, dos limites de renda familiar mensal exigidos para concessão das bolsas integrais e parciais no âmbito do PROUNI.
Ao invés de buscar uma solução que efetivamente permita a expansão dos benefícios do PROUNI para uma parcela maior da população que almeja o acesso ao ensino superior, o MEC prefere seguir pela trilha já tradicional do preconceito contra o ensino privado.
A proposta atual do MEC prevê a concessão de isenção parcial dos tributos previstos no artigo 8º da Lei n° 11.096/2005, em regime proporcional ao preenchimento das bolsas ofertadas no âmbito do PROUNI.
Pode até ser uma solução para os problemas enfrentados pelo programa, desde, é claro, que não seja imposta, em caráter retroativo, para afetar as IES que já tenham aderido ao Programa Universidade Para Todos – PROUNI, pois estas se encontram albergadas pela proteção constitucional ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito.
Obviamente, as IES que já fizeram sua adesão originária ao PROUNI, independentemente das renovações semestrais, fazem jus à manutenção das condições originalmente estipuladas pela Lei n° 11.096/2005, segundo a qual o direito à isenção plena dos tributos previstos em seu artigo 8º depende apenas da efetiva adesão ao programa.
Desse modo, ao mesmo tempo em que precisamos repensar a situação do PROUNI e encontrar soluções para as fraudes que impedem o acesso dos estudantes que efetivamente fazem jus aos benefícios do programa, faz-se necessário firmar posição em defesa do direito adquirido das IES que já tenham formalizado sua adesão ao mesmo, cuja regra legal não pode ser modificada neste momento.
Fundamental manter atenção ao tema, uma vez que a gestão do Ministério da Educação, mantida pela nova governante, já demonstra claramente sua intenção de manter a triste história de ilegalidades e arbitrarieades que marcaram os últimos oito anos.
(*) Especialista em Direito Educacional e Consultor Jurídico do ILAPE – Instituto Latino-Americano de Planejamento Educacional e da ABMES – Associação Brasileira de Mantenedores de Ensino Superior. Professor do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito e Gestão Educacional e coautor do livro LDB Anotada e Comentada e Reflexões sobre a Educação Superior – 2ª edição revista e ampliada.

Um comentário:

  1. Parabéns pelas considerações Dr. Gustavo. É altamente injusta a atribuição imposta às IES. Outra questão é o impedimento de cobrança de dependências de alunos bolsistas 100%, uma vez que é possibilitado ao aluno a reprovação em 25% das disciplinas cursadas.
    Abraços
    Edson Makoto Ueno

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